Esta é a pergunta que começará a ser respondida pela mais elevada Corte de Justiça do País, o Supremo Tribunal Federal, a partir do julgamento do RE 946648/SC, afetado pelo reconhecimento de existência de repercussão geral, conforme a sistemática do art. 1.036 e seguintes do Novo Código de Processo Civil. Aliás, quis o destino e a boa técnica que o Recurso Extraordinário 946648, produzido em nosso escritório, no processo patrocinado em nome do cliente POLIVIDROS COMERCIAL LTDA., fosse o escolhido como leading case que irá resolver a questão para todo o território nacional.
A contenda cinge-se em discutir a legitimidade ou não da exigência de IPI na saída dos produtos importados do estabelecimento comercial. Em outras palavras: o comerciante nacional importa produtos das mais variadas espécies para, sem qualquer ato de industrialização, revender no mercado interno. Para tanto, no momento da nacionalização do produto, que ocorre no desembaraço aduaneiro, o comerciante/importador já recolhe os diversos tributos exigidos, entre eles o Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI.
Ocorre que ao promover a revenda destes produtos importados no mercado interno, novamente o Fisco exige deste comerciante o recolhimento do IPI, com fundamento na sua peculiar interpretação do art. 46 do Código Tributário Nacional.
O supramencionado dispositivo legal trata das hipóteses de incidência do IPI, quais sejam: (i) o desembaraço aduaneiro; (ii) a saída dos estabelecimentos a que se refere o parágrafo único do art. 51; ou (iii) a arrematação quando se tratar de produto apreendido ou abandonado levado a leilão.
O que a Fazenda Pública não entende é que as hipóteses antes elencadas são alternativas e excludentes e não cumulatórias, como se a hipótese de incidência do imposto pudesse ser fracionada em diversos momentos, ou que pudesse se perpetuar no tempo ad aeternum.
Por seu turno o art. 51 do CTN, em seus incisos I e II, preveem que é contribuinte do IPI “o importador ou quem a lei a ele equiparar”, e “o industrial ou quem a lei a ele equiparar”.
Assim, é inequivocamente inconstitucional a exigência do imposto sobre o mesmo produto em duas oportunidades, o que caracteriza o bis in idem (exigência do imposto duplamente pela mesma pessoa política, no dizer de CARRAZZA), uma vez que já tendo havido a tributação do IPI no desembaraço aduaneiro, não há que se falar em uma nova exigência por ocasião da saída dos produtos do estabelecimento importador.
Igualmente é inconstitucional a exigência desta exação, por ocasião da saída dos produtos, na medida em que o importador, ao ser equiparado ao industrial nacional, deve, em homenagem ao princípio da isonomia consagrado no art. 150, II, da Constituição da República, estar sujeito as mesmas regras daquele, ou seja, o industrial nacional sofre a tributação pelo IPI uma única vez (na saída dos produtos industrializados do seu estabelecimento).
Então, o comerciante importador, ao ser equiparado ao industrial nacional (desde que não proceda a nenhum ato de alteração, melhoramento, embalagem e outros que configure industrialização do produto importado), deve recolher o IPI apenas por ocasião da nacionalização dos produtos importados, no desembaraço aduaneiro. Esta é, em resumida análise, a tese defendida pelo escritório em relação a esse tema.
Existem, ainda, outros argumentos, tal como a comparação/equiparação da exigência do IPI na saída para o mercado interno com o ICMS, o que caracterizaria a bitributação (mesmo fato jurídico vem a ser tributado por duas ou mais pessoas políticas, também na lição de ROQUE CARRAZZA), violando, portanto, o art. 155, II, da CRFB/88. E, ainda, violação a dispositivos do GATT, do qual o Brasil é signatário, que veda a imposição de diferentes regras para produtos oriundos de países igualmente signatário deste acordo.
Espera-se, dada a importante repercussão econômica que este caso contempla, que o Supremo Tribunal Federal venha a enfrentar a matéria, agora sob a perspectiva do Texto Constitucional. De nossa parte estamos envidando todos os esforços para que o nosso recurso contribua para mais uma vitória do contribuinte.
Simone Bechtold – advogada coordenadora da Célula Tributária DJE Advogados Associados