Inventariante não pode alterar o controle societário de companhia

Para especialistas, decisão do STJ reforça a importância de que a cultura no Brasil mude em prol de um melhor planejamento sucessório para que as disputas sobre espólios sejam mitigadas

São Paulo – O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o inventariante do falecido sócio de uma empresa não tem o direito de alterar a composição societária ou vender bens da sociedade sem pelo menos obter autorização judicial.

Para a sócia da área de Contencioso de TozziniFreire Advogados, Mônica Mendonça Costa, existe uma discussão muito grande acerca dos limites na atuação do inventariante porque a morte de um sócio cria uma “ficção jurídica”, que é a transmissão imediata de bens. “Todos os herdeiros recebem os bens e a lei considera que a transmissão é imediata, só que esses valores são administrados pelo inventariante”, comenta.

Na opinião da advogada, essa decisão é importante não apenas porque trata de uma matéria controvertida, mas porque mostra a importância de uma mudança de cultura no Brasil em que os donos de empresas pensam muito pouco em sucessão.

“De uns tempos para cá isso melhorou, porém ainda é algo que ocorre menos do que em outros países. É preciso haver uma atuação muito mais preventiva do que reparadora”, avalia.

Já o sócio do escritório Watanabe Pascowitch Advogados, Ricardo Watanabe, afirma que a função do inventariante é zelar pelos bens do falecido até que cheguem à posse dos herdeiros, não transformá-los ou aliená-los. “O inventariante também não pode jamais alienar bens do espólio. Muitas vezes, ele tem bens perecíveis no espólio, que não terão valor se ele não aliená-los, mas mesmo nesses casos ele precisa buscar uma autorização”, afirma.

A questão começou quando os herdeiros do sócio de empresa familiar entraram na Justiça de Goiás alegando que o poder de gestão conferido ao inventariante estava sendo excedido. O responsável pela administração dos bens do falecido havia tentado converter ações preferenciais – que não dão direito a voto, mas têm preferência na distribuição de dividendos – em ordinárias – que dão direito a voto.

Sentença

Em primeira instância, o juiz considerou que o inventariante possuía poderes para votar em nome do espólio em eventual assembleia social. Entretanto, ele poderia ser responsabilizado por possíveis prejuízos causados ao espólio.

Já no Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO), o poder do inventariante de votar em nome da companhia foi suspenso. O réu decidiu entrar com recurso no STJ para reverter a decisão sob o argumento de que as ações deixadas pelo faleci-do seriam parte do espólio e, portanto, deveriam recair sob sua administração.

Na Corte, o relator do processo na Terceira Turma, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, explicou que, conforme os artigos 991 e 992 do Código de Processo Civil (CPC) de 1973, convertidos em artigos 618 e 619 do novo CPC, o inventariante deve conservar o patrimônio que integra o espólio, com a realização de atos como o pagamento de tributos e de aluguéis, a fim de que, ao final da divisão, os bens tenham o seu valor mantido.

Contudo, a conversão das ações concederia poder de voto a quem não possuía essa prerrogativa. Assim, haveria mudança no controle acionário da companhia.

“Não há como entender que o voto do inventariante para modificar a natureza das ações e a própria estrutura de poder da sociedade anônima esteja dentro dos limites estabelecidos pelo CPC”, expressou o magistrado na sentença.

De acordo com Watanabe, é importante que os herdeiros conheçam os limites de atuação do inventariante até mesmo para poder recorrer ao Judiciário se houver abuso. “O administrador pode ser removido do cargo se agir fora dasua função”, conclui o especialista do WPA.

 Autor: Ricardo Bomfim

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